Formulação gradual do conceito de morte pela mente de uma criança (Coimbra de Matos, 1997):
1. aos 3 anos de idade: a morte é concebida de forma violenta. A morte por doença, privação alimentar ou envelhecimento é desconhecida; apenas aquela que pode ser infligida é vagamente concebida.
2. 4-6 anos de idade: medos relacionados à rivalidade edipiana, a par dos anteriores orais e anais aqui actualizados. Estes são, porém, mitigados ou anulados pelo sentimento de protecção e cuidado que a criança retira do seu relacionamento com os pais. Aparece a angústia de castração no seu sentido simbólico sob a forma de um ferimento ou da perda de uma parte do corpo. Nesta etapa do seu desenvolvimento, a criança receia a morte dos pais mais do que a sua própria morte. O medo inerente é aqui o do desaparecimento do amparo e protecção que lhe permitem a sensação de omnipotência. A morte é aqui concebida como um acontecimento transitório, portanto, reversível.
3. 7-8 anos de idade: a criança começa a preocupar-se verdadeiramente com a sua morte. Surge a noção de morte por doença ou velhice. As angústias de redução ao nada, do perder-se pelo espaço sideral, de dissolução, de queda num abismo sem fundo são substituídas por representações concretas (cemitérios, túmulos) e personificações ( esqueletos, uma velha com uma foice, o 'anjo da morte'). Apesar de conhecer já a doença,não lhe atribui ainda um possível carácter fatal. Surge a noção de irreversibilidade.
4. 9-10 anos de idade: a criança deixa de atribuir de forma tão omnipotente características mágicas protectoras a si ou aos outros. Assim, a anisiedade face a uma doença grave é agora mais dificilmente reduzida. Surge um novo tipo de ansiedade - a angústia existencial; elaborada por importantíssimas discussões e reflexões de ordem psicológica,social,filosófica, religiosa e ética. A morte é agora percebida como um facto definitivo, irreversível e inevitável.
Considera-se como resolução mais adaptada da mortalidade biológica aquela que passa pela aquisiçãi de noção de imortalidade simbólica: a importância da descendência, das obras culturais, do facto de ficarmos para sempre na memória dos outros, etc. O contrário pode passar por sentimentos de exclusão e de abandono, que reforçam a angústia de morte.
A este respeito, Aberastury (1978) defende a utilização de um importante 'instrumento' de manejo da angústia de morte: a verdade. Propõe que falar sobre esse tema não cria nem aumenta a dor que lhe é inerente; antes alivia e ajuda a elaborar a perda. Aberastury acredita que existem verdades muito difíceis de aceitar para um adulto e que, ao mentir, este estará a delegar na criança essa responsabilidade; para além de poder provocar uma inibição do impulso epistemofílico. Segundo a autora, versões supostamente facilitadoras de elaboração, como a do céu, entravam todo o processo de conhecimento da criança. A um nível mais extremo, o ocultamento da morte de alguém significativo pode acarretar transtornos desenvolvimentais e perturbar o vínculo da criança com o mundo adulto. Até porque qualquer pessoa terá a possibilidade de recorrer dos seus próprios mecanismos de defesa para lidar com o tema: negação, repressão, intelectualização, deslocamento (Kóvacs, 1992).
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